Alguém cético ou pouco informado poderia perguntar:
– Qual é o interesse da mensagem de Fátima, para a humanidade contemporânea? Sobretudo hoje, após a revelação da terceira parte do segredo, teria ainda atualidade essa mensagem e o que ela pode nos dizer?
Na realidade, a mensagem de Nossa Senhora transmitida em Fátima é a chave para entender não só o século XX, mas também os dias que estamos vivendo e aqueles que estão por vir.
A humanidade pecadora não se emendou
Os três videntes, logo após a visão do inferno |
A Mãe de Deus falou a três pastorinhos – Lúcia, Jacinta e Francisco (estes dois últimos beatificados a 13 de maio de 2000) – e, através deles, ao mundo inteiro. Ela os encarregou essencialmente de comunicar à humanidade sua profunda aflição diante da impiedade e da corrupção dos homens. Caso estes não se emendassem, acrescentou a Santíssima Virgem, sobreviria um castigo terrível.
O século XX chegado a seu fim, é forçoso reconhecer que a humanidade pecadora não se emendou. Ao contrario, está mergulhada numa tremenda crise de múltiplos aspectos: moral, familiar, social, religiosa… Para o mundo sair da crise, Nossa Senhora apresentou muito claramente uma alternativa: a conversão ou o castigo.
O inferno é o castigo supremo apontado por Nossa Senhora para os pecadores que não se arrependem
O inferno – iluminura das Très riches heures du Duc de Berry, séc. XV, Museu Condé, Chantilly (França) |
Primeiramente, na aparição de 13 de julho de 1917, Ela falou do castigo na outra vida, castigo eterno, supremo, definitivo: a condenação ao inferno dos pecadores que morrem sem se arrepender. A Mãe de Deus não hesitou em mostrar o inferno aos três videntes, que tinham então dez, nove e sete anos… Este aspecto da mensagem de Fátima constitui o “primeiro segredo” ou, mais exatamente, a primeira parte de uma só e mesma mensagem.
A segunda parte – ou “segundo segredo” – concerne à humanidade ainda nesta vida, colocando-a diante de uma grande alternativa: se os homens “não deixassem de ofender a Deus”, Este “vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre”. A guerra é portanto apresentada como um castigo por causa dos pecados dos homens. A menos que se convertam. E Nossa Senhora acrescenta: “Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração”.
Maria Santíssima contudo vai ser ainda mais precisa quanto ao castigo que anuncia. Com efeito, a Rússia é apontada como o instrumento dessas guerras: [A Rússia] “espalhará seus erros pelo mundo, propagando guerras e perseguições contra a Igreja”.
Os “erros da Rússia”: extirpar das almas toda forma de religião transcendente e implantar uma verdadeira anti-religião
Se os malefícios do comunismo são os erros que a Rússia espalha pelo mundo, como entender essa profecia após o desmoronamento da URSS?
O programa dos bolcheviques em 1917 colocava em prática doutrinas igualitárias nascidas e desenvolvidas na Europa ocidental, particularmente na França. Tais doutrinas surgiram por ocasião da “conspiração dos iguais”, no auge da Revolução Francesa. Elas vieram a constituir um sistema acabado com o “Manifesto” comunista de 1848, e inspiraram a “Comuna de Paris” de 1871, com seu sinistro cortejo de sacerdotes martirizados, igrejas profanadas, palácios queimados, crimes e blasfêmias perpetrados em nome da utopia igualitária.
Marx e Engels, teóricos do comunismo; Lenin, que implantou o comunismo na Rússia. Os “erros da Rússia” apontados por Nossa Senhora em 1917, atingiram o núcleo da vida social e religiosa do Ocidente |
Em 13 de julho de 1917 – dia da solene advertência de Nossa Senhora a respeito dos “erros da Rússia” – os próprios bolcheviques, em sua maioria, não acreditavam ser possível que essa doutrina pudesse assumir imediatamente a direção da Rússia. Lênin acabava de voltar ao país graças a poderosos apoios ocidentais e o chefe do governo provisório, o Príncipe Lvov, tranqüilizava a população afirmando que o antigo Império dos czares iria fundir-se numa “democracia universal”.
A realização da profecia de Nossa Senhora
Entretanto, contra toda verossimilhança, a 7 de novembro algumas centenas de militantes comunistas, reforçados por desertores e aventureiros, tomaram de assalto o poder e erigiram a impiedade e o crime brutal em sistema de governo. Imediatamente, o partido bolchevique começou a espalhar “seus erros” pelo mundo inteiro, confirmando assim as palavras da Virgem Santíssima.
Até então, nunca se tinha visto um governo estável propor um tal conjunto de aberrações: a instauração do igualitarismo mais completo e a supressão da propriedade privada, o divórcio e o amor livre, o aborto e a contracepção, os “direitos” dos homossexuais, a “libertação” da mulher, a eutanásia, a omnipresença do Estado ou totalitarismo, a hiperplanificação tecnocrática da vida. Tudo isso tendo por objetivo final extirpar das almas toda forma de religião transcendente e implantar uma verdadeira anti-religião: a do materialismo e do relativismo…
A Rússia foi um gigantesco aerossol, hoje aparentemente vazio, mas que contaminou o mundo
Durante quase um século, a Rússia propagou pelo mundo, qual gigantesco vaporizador, os erros por ela adotados, até à última partícula. Hoje pode parecer que o aerossol está vazio, mas o mundo está contaminado… Cumpriu-se portanto a profecia de Nossa Senhora: a maior parte dos erros que em 1917 eram propugnados apenas pelos comunistas, hoje é adotada pelo conjunto dos principais partidos políticos do mundo inteiro. Nas instâncias internacionais, esses erros são até considerados como norma a seguir. São os “erros da Rússia” que se espalharam pelo mundo inteiro. E até mesmo – oh dor! – atingiram profundamente importantes setores da Igreja Católica (*). O que recorda as célebres palavras de Paulo VI sobre o “processo de autodemolição”, e a “fumaça de Satanás no Templo de Deus”.
Hoje os “erros da Rússia” atingiram o núcleo da vida social e religiosa do Ocidente
Como não ver que esse conjunto de erros chamado comunismo, longe de ter desaparecido, embebeu profundamente o Ocidente, sem que seja preciso mais, para tanto, recorrer aos blindados soviéticos? Com a mais avançada forma de revolução – por vezes chamada de contra-cultura ou revolução cultural – ele destrói sistematicamente a tradição cristã, base de nossa civilização; dirige uma guerra aberta contra a moral, arruinando até os fundamentos da família; por fim, promove o igualitarismo desenfreado que procura suprimir até o princípio da propriedade privada – princípio no entanto tão essencial, garantia da instituição da família, parte integrante da doutrina pontifícia e protegido por dois Mandamentos da Lei de Deus.
Em resumo, hoje o mundo está ainda mais atolado no pecado do que na época das aparições de 1917 e os “erros da Rússia” atingiram o núcleo da vida social e religiosa do Ocidente. O apelo de Nossa Senhora à penitência não teve a acolhida que merecia e o castigo pelos crimes da humanidade abateu-se sobre ela num crescendo espantoso. A segunda guerra mundial e os crimes do nazismo, os mais de 100 milhões de mortos de que são responsáveis os regimes comunistas e seus aliados, as guerras incessantes e as perseguições religiosas que redobram, são exemplos gritantes. O que se pode então concluir?
Nesse auge de mal em que o mundo está mergulhado, é revelado o “terceiro segredo”
É justamente nesta situação – dramática por tantos lados – que a terceira parte da mensagem de Fátima, ou “terceiro segredo”, foi revelada pela Santa Sé, em 26 de junho de 2000.
A terceira parte é a visão de um anjo brandindo uma espada de fogo que ameaça a terra e grita com voz forte: Penitência, penitência, penitência! Depois, o Papa, Bispos, sacerdotes, religiosas, homens e mulheres de todas as condições sobem, em meio a uma cidade em ruínas, uma colina onde se encontra uma grande cruz e lá são martirizados. O sangue dos mártires é recolhido por anjos que com ele irrigam as almas que se aproximam de Deus.
Castigo, perseguições, martírio e volta das almas a Deus
Assim, não só os funestos “erros da Rússia” espalharam-se pelo Ocidente e o mundo inteiro, destruindo sistematicamente a Civilização Cristã, mas as perseguições, sangrentas ou não, se multiplicam; aqueles que manifestam e professam sua adesão aos princípios imortais da Moral cristã, fundamento da única verdadeira civilização, já são perseguidos ou o serão em breve:
Perseguido e punido pela lei o médico católico que se recusar a praticar um aborto; perseguido e punido pela lei o católico que afirmar, como ensina o catecismo, que a prática da homossexualidade é um pecado contra a natureza; perseguido e punido pela lei o professor ou o diretor de escola católica que se negue a ensinar a libertinagem sexual no seu estabelecimento; perseguidos os sacerdotes que se recusem a violar o segredo de confissão; perseguidos os católicos que, isolados ou reunidos em associações, queiram fazer ouvir sua voz na sociedade como eco do Magistério da Igreja… sem falar dos numerosos países em que, hoje, é derramado abundantemente o sangue dos cristãos pelo martírio.
É, pois, necessário ver as coisas de frente. Conforme advertia o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, grande apóstolo de Fátima, “há uma trama colossal para derrubar nos fiéis a convicção de que o mundo moderno é mau, de que vai receber o castigo de Deus, de que a Mensagem se cumprirá em razão do pecado. Tudo isto não se crerá mais. No momento em que não crerem e em que o demônio der gargalhadas, dizendo: ‘Desta vez nós logramos Aquela em cima, cujo nome não ousamos pronunciar’, Ela fará conhecer que jamais deixou de pisar a cabeça da Serpente”(Palestra em auditório da TFP — 20/1/1990).
Para evitar, na medida do possível, as conseqüências terríveis do desencadeamento final dos castigos anunciados por Nossa Senhora e apressar a aurora bendita do triunfo do Coração Imaculado de Maria – que Ela prometeu – devemos recorrer aos meios indicados: uma devoção mais fervorosa para com a Mãe de Deus, a oração e muito particularmente a recitação do Rosário, a penitência, a prática dos Mandamentos da Lei de Deus. Somente assim resolver-se-á a terrível crise mundial. Somente assim estarão reunidas as condições para uma paz verdadeira e duradoura: a paz de Cristo no Reino de Cristo, e mais particularmente a paz de Maria no Reino de Maria. |